terça-feira, 31 de julho de 2012

A Família Aguiar - ULTIMO CAPITULO



Arthur se acomodou na escrivaninha no escritório que dividia com seu tio no estábulo, incapaz de se concentrar. Paco insistia em lançar olhares furtivos na sua direção, deixando o rapaz mais transtornado do que já estava.
— Você está bem, Thur?
Tentado a acender um cigarro, amarrou a cara. Sem sombra de dúvida que deveria estar mofado.
Paco falou com ele de novo, quebrando o silêncio, penetrando o coração de Arthur.
— Você já está com saudades de Lua.
— Ela não foi embora ainda. — Tirou um cigarro do maço, cortou em dois e observou o tabaco emporcalhar sua gaveta.
— Você está com saudade assim mesmo.
— Lua faz parte da minha vida desde que eu era garoto. — E seis dias se passaram desde que ela decidiu partir. Miguel estava quase 
recuperado o suficiente para viajar, então era só uma questão de tempo até que ela empacotasse as coisas e sumisse.
Lua estava considerando a possibilidade de se estabelecer no Oregon ou em Washington, talvez na Califórnia do Norte. Prometeu manter contato, é claro. Mas isso não reduzia o vazio.
E se Lua não se sentisse feliz no Oregon ou em Washington, ou em qualquer outro lugar onde estivesse? E se levasse em consideração que aquela era uma mudança monumental?
E se Lua ligasse para os agentes do FBI e pedisse a eles para se unir a Mica no Programa de Proteção à Testemunha?
Arthur perderia a garota e Miguel para sempre. Sua mulher e seu filho não existiriam mais. Suas identidades seriam trocadas, e sua família estaria perdida.
Em pânico, Arthur saltou da escrivaninha, então se ergueu sobre pernas vacilantes, subitamente desesperado para ver Lua.
— Vou dar uma passada em casa — avisou ele.
Sem esperar resposta, Arthur deixou o estábulo, entrou na caminhonete e dirigiu rumo à casa de fazenda.

Encontrou Lua debruçada sobre a mesa de jantar, digitando seu currículo em um laptop, o computador que sempre compartilharam.
Presumiu que Miguel estivesse mergulhado na sua soneca, dormindo naquela tarde silenciosa.
Quando Arthur remexeu os pés, Lua espiou por cima dos ombros, então se virou de volta para o seu trabalho, evitando o olhar dele.
O que estava fazendo ali? Torturando a si mesmo?
— Estou com medo de uma coisa — disse Arthur, dando a volta na mesa para que ela pudesse vê-lo.
— Do quê?
— De que você desapareça. De que você entre no Programa de Proteção à Testemunha com Mica e que nunca mais eu possa ver você ou Miguel novamente.
— Eu jamais faria uma coisa dessas. — Lua recuou um pouco a cadeira. — Por mais que sinta falta do meu irmão, eu sentiria muito mais saudades suas. Eu sequer imaginei em não ver você de novo, não manter contato pelo telefone ou...
— Não me deixe, Lua. — Deixou as palavras escaparem, seu coração explodindo dentro do peito. — Por favor, não vá.
Abismada, a garota olhou para ele.
— Por quê? — perguntou ela, colocando as luzes sobre ele. — Por que eu deveria ficar?
— Porque eu estou...
— Você está o quê? — pressionou Lua.
— Estou apaixonado por você.
Os olhos dela se arregalaram, e sua voz ficou trêmula.

— Desde quando?
— Desde que você tinha 16 anos, e eu era velho demais para ter você.
— Você me chamou de chave-de-cadeia.
— Eu queria você. Mais do que você pode imaginar. Por um momento, eu levei sua oferta em consideração.
— Minha
oferta? — Sua voz falhava. — A cerimônia secreta?

— Ainda está valendo?
A mão de Lua tremia sobre a dele.
— Você quer se casar comigo?
— Sim, mas não em segredo. Eu quero um casamento público, com os amigos, a família e...
Seus olhos ficaram cheios de lágrimas.
— Oh, Arthur. Você tem certeza?
— Tenho. — Agora ele compreendia os próprios sentimentos, a maneira como confundira o amor com a solidão. — Eu não quero viver sem você. Tive medo de admitir o quanto preciso de você. Mas não tenho mais medo.
Lua levantou da cadeira e foi até ele, deslizando seus braços em volta dos seus ombros, acalmando Arthur. Ele se ergueu, e à luz do dia, contemplaram um ao outro. Arthur não repetiu sua pergunta, indagando se ela ainda queria ser sua esposa. Podia ver a resposta nos olhos dela.
Lua estendeu as mãos para os botões da camisa dele e foi abrindo um por um. Precisava se despir da mágoa do passado, pressionar seu rosto contra o coração de Arthur e criar uma nova recordação.
Arthur Aguiar a amava. E sempre amou.
— Desisti dos sonhos.
Arthur a abraçava apertado.
— Eu também. Mas não vou desistir, nunca mais.

— Nem eu. Como você soube, Thur? O que fez você reconhecer que me amava?
Beijou o alto da cabeça de Lua, dando-lhe coragem para olhar para ele.
— Foi uma coisa que o meu tio me disse. Ele me perguntou como eu me sentiria se não a visse mais. E de repente eu estava em pânico, com medo de perder você de vez.
— Estou aqui para ficar — Lua garantiu a ele. — Nunca mais vou embora.
— Me desculpe por magoar você — murmurou Arthur. — Por renegar meus sentimentos a seu respeito.
— Nem eu. Como você soube, Thur? O que fez você reconhecer que me amava?
Beijou o alto da cabeça de Lua, dando-lhe coragem para olhar para ele.
— Foi uma coisa que o meu tio me disse. Ele me perguntou como eu me sentiria se não a visse mais. E de repente eu estava em pânico, com medo de perder você de vez.
— Estou aqui para ficar — Lua garantiu a ele. — Nunca mais vou embora.
— Me desculpe por magoar você — murmurou Arthur. — Por renegar meus sentimentos a seu respeito.
— Me desculpe, também. — Lua jamais pretendera fugir, deixando Arthur afogado em medo.
— Você
já se desculpou o bastante, Lua. É hora de ir em frente.
— Mas
nosso bebê não sobreviveu. Se eu tivesse ido a um hospital, se eu tivesse...
— Shh. — Arthur passou a mão pelos cabelos dela, consolando-a. — Não foi culpa sua.
— Eu devia ter dado um nome a ele.
— Não. — Arthur sacudiu a cabeça. — Você fez a coisa certa. Seguiu o velho costume Cherokee. — Fez uma pausa, tomou um fôlego profundo. — Você vai me levar ao local onde ele está enterrado?

— Sim. — Lua compreendeu que Arthur precisava se despedir da criança que ele não conhecera, o pequenino que ela embalara no ventre.
Quando ambos caíram em silêncio, Arthur a levou para o quarto e a beijou, recomeçando o dia, refrescando sua confissão de amor.
Lua aceitou o que ele lhe oferecia, perdida na beleza da mágica, dos desejos embalados em papel prateado e sonhos embebidos no aroma das flores. Percorrendo o corpo dele, Lua parou para tirar seu cinto e abaixar seu jeans. Arthur a reclinou sobre a cama, e eles relaxaram sobre os lençóis, despindo um ao outro, mãos e bocas em mútua procura.
Seus lábios se encontraram, suavemente, lentamente, impondo um ritmo lânguido. Lua fechou os olhos, e então abriu-os novamente, observando enquanto Arthur acariciava a ondulação dos seus seios. Sua língua provocava, prolongando aquele momento.
Arthur, Lua e Miguel chegaram a Oklahoma numa tarde quente e seca. A estrada até a cabana era uma longa e árdua viagem, um caminho flanqueado por formações rochosas e folhagem. Não era o cenário familiar da terra natal de Arthur, mas ainda assim era belo. O solo estava coberto por mato, árvores e pequenas flores amarelas, que cresciam como ervas daninhas.
Quando a cabana surgiu no horizonte, Arthur olhou atentamente para a primitiva estrutura de madeira. Lua sorriu para ele, e seu coração se tornou quente como cera, derretendo-se como vela. Sabia que isso seria difícil para ela, retornar ao local onde dera à luz e sepultara um filho. Mas Lua estava ali por sua causa, o pai da criança perdida.
Estacionou junto à cabana, e Miguel despertou no assento traseiro, espreguiçando e gemendo.

— Você está pronta? — Arthur perguntou a Lua.
Ela acenou que sim com a cabeça, e saíram do veículo. Arthur retirou o cinto de segurança de Miguel e ergueu o menino nos braços. Miguel se agarrou a ele, ainda lutando contra o sono. 
Arthur alisou os cabelos negros e espessos do garoto e se aproximou de Lua.
— É por aqui — mostrou ela, guiando-os pela construção grosseira até uma floresta que se estendia por quilômetros.
Avançaram por uma trilha sinuosa e entre troncos descascados e arbustos. Subitamente Arthur avistou a árvore que marcava o túmulo do bebê. Ela se erguia do solo como um anjo, sua floração de verão tão branca e macia como penas.
Com Lua ao seu lado, eles se ajoelharam sob a árvore. Arthur sentou Miguel na sua frente e deixou que o menino enchesse as mãos com as flores caídas.
— Havia um outro bebê — contou Lua para Miguel. — E nós viemos aqui nos despedir dele.
— Ele tinha um pônei igual ao seu — acrescentou Arthur.
— Pa? — A criança olhou para cima. Estava próximo do seu primeiro aniversário, suas pernas pequeninas se tornavam cada vez mais robustas. Logo estaria andando, correndo pela grama em volta da casa.
— O outro bebê era nosso filho — prosseguiu Arthur. — Mas você é nosso filho, também. — O filho dos seus corações, pensou. O menino doce e bonito a quem eles iriam amar e acarinhar para o resto das suas vidas.
Miguel entregou uma das pétalas brancas para Arthur, e ele a aceitou de bom grado, segurando-a como um floco de neve na palma da mão.

— Sophia está com ele — Lua disse. — Estamos cuidando do filho dela e ela está cuidando do nosso.
Arthur concordou. Seus olhos lacrimejaram de novo, mas não queria chorar. Não queria se entristecer naquele instante.
Fazendo as pazes com suas emoções, beijou a face de Lua. Ela deitou a cabeça no ombro dele, e por um momento permaneceram em silêncio.
Enfim, Arthur recitou uma prece Cherokee que o tio lhe ensinara há muito tempo. Enquanto ele proferia as palavras, Miguel sentou no seu colo, escutando a linguagem dos seus ancestrais.
Depois disso, Arthur disse adeus para o outro bebê e estendeu a mão para Lua. Era hora de voltar para casa, pensou ele. Para casar com a mulher que ele amava e criar o filho com o qual o Criador lhes presenteara.

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